JollyRoger 80´s

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sexta-feira, 10 de julho de 2020

Vampiros, Mutantes e Arquivos Imperiais

Thomas Richards em The Imperial Archive: knowledge and the fantasy of Empire estabeleceu a relação entre “O Arquivo e o Monstro” e analisou de que forma o Arquivo se transforma em um instrumento privilegiado de sustentação de poder. 

Com o olhar no contexto histórico da Era Vitoriana, ele questiona a distância entre a autoimagem da unidade do Império Inglês, relacionando com a realidade apresentada nas possessões imperiais.

O autor se debruça na ideia da sensação de domínio e controle por parte do homem vitoriano em relação aos territórios (as colônias). Essa sensação de dominação à distância teve como base a produção e a organização sistemática de informações em virtude da inexistência ou escassez de formas realmente efetivas de controle.


Com isso em mente e fazendo uso de categorias etnocêntricas, as diferenciações são projetadas. Essas categorias são basicamente formas de moldar, enquadrar e classificar. E deram arcabouço para a implementação de projetos institucionais e coloniais imperialistas.

Dessa forma é firmada uma projeção civilizatória onde o Homem Europeu encontra-se na escala máxima e a cultura do “outro”, do “diferente” é registrada e catalogada com base de sustentação cientifica. 

Sobre a questão acima, é importante observarmos que fazer julgamentos da postura dos homens do passado sob os valores morais e ideológicos da atualidade é um anacronismo e um erro terrível no trabalho de um historiador.  

Arquivos Imperiais

Todo conhecimento produzido é direcionado aos Arquivos imperiais e a produção e organização de informações a respeito dos territórios do Império auxiliaram na definição de políticas de manutenção do controle. Richards considerou crucial o momento em que a constituição do “arquivo” substituiu ou compensou um controle efetivo real do Império. 

Na visão do autor,quando se detém conhecimento para falar sobre o “outro”, automaticamente o detentor dessa informação se enxerga superior. Ao mesmo tempo a sensação de submissão se interioriza nos corações e mentes dos analisados, desse “outro”. 

Novamente, essa afirmação é o ponto de vista do autor ou a ideia que o mesmo possui da postura dos homens do Império Britânico do passado. O autor trabalha com a metáfora e papel do “monstro” no processo informacional. Mas o que ou quem seria esse monstro? 

Em relação a isso, Richards realiza uma interessante analogia com o clássico “Drácula” de Bram Stoker, o conto de terror que aparentemente impulsiona a presença de monstros na ficção Vitoriana.

O Monstro é o desconhecido, o não-catalogado, um elo atrasado na cadeia evolutiva. No século XIX com os estudos da morfologia na chave evolucionista não havia mais lugar para o monstro, na medida em que, toda forma de vida passou a ser enquadrada num processo de escala evolutiva.

Com isso, ao final do XIX, o monstro é encarado como um mutante, então, o Vampiro seria um mutante. E os mutantes nas teorias cientificas do final desse século podiam saltar vários degraus evolutivos e produzir novas espécies. 


Richards percebe a obra de Bram Stoker como a representação de uma revolta colonial em que o Conde Drácula, o monstro, o outsider que vive à margem do mundo metropolitano, ingressa na civilização imperial.



O Vampiro é uma criatura sedutora e desconhecida que obriga o homem civilizado a reunir uma série de dados e informações com o intuito de produzir conhecimento e dessa forma, decifrá-lo. Acrescente-se a ideia de que o próprio Drácula é compelido a utilizar-se das regras e normas do mundo metropolitano para deslocar-se e agir.



O monstro finalmente é caçado e exterminado. Richards ressalta que seu ponto fraco não estava somente na sua ineficácia do controle do fluxo de novas informações, mas sim, em sua dependência dos intermediários culturais e físicos de seu deslocamento para o centro metropolitano.


Lembremos que a criatura atravessou o oceano até dentro de caixas de madeira contendo terra de seu habitat natural. Drácula não foi capaz de modificar o sistema a seu favor. Portanto, a existência de um Arquivo substituiria a necessidade de um controle real. Até que ponto isso pode não ser um exagero? Talvez sim, talvez não. Porque devemos lembrar que o dado factual em um documento é também algo subjetivo e não uma verdade absoluta. 

O poder da informação/ o problema do excesso de "informação"

De qualquer forma, devemos ter em mente que informação é poder. Era no passado e ainda é atualmente. Não é à toa que vivemos em uma época conhecida como sociedade da informação, onde fake news conseguem enganar milhares de pessoas e grupos políticos e sociais travam diárias batalhas de narrativas.

O poder descentralizado das trocas de informações principalmente na internet é uma realidade. E que como tudo, apresenta vantagens e desvantagens, aspectos positivos e negativos. Hoje todas as pessoas se sentem compelidas a dar opinião sobre tudo, mesmo sobre assuntos aos quais não possuem  nenhum tipo de conhecimento. 

E é óbvio que essa liberdade de expressão deve ser preservada, mas é notório que a velocidade de informações faz com que muito lixo seja produzido e divulgado rapidamente. Excesso de informações não significa necessariamente produção e divulgação de conhecimento realmente útil. 


Portanto,  o homem civilizado do século XXI precisa navegar com muita atenção e cuidado para fazer uso das melhores informações, pois com tanto conhecimento disponível o que mais temos visto é militância, ódio, fanatismos e pouco estudo e racionalidade. Precisamos urgentemente de mais Dráculas e Van Helsings. Eles até estão por aí, em menor número, quase lendas, mas estão sendo ofuscados por monstros influencers de instagram e twitter.



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