JollyRoger 80´s

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sexta-feira, 19 de junho de 2020

Destruição de estátuas: Reparação histórica ou estupidez pseudo-revolucionária?


Nas semanas que se seguiram aos legítimos protestos antirracistas em resposta ao covarde assassinato do cidadão George Floyd nos Estados Unidos observamos os excessos provocados por aproveitadores desordeiros e pelos revolucionários de plantão. Quebra quebra, depredação de lojas, agressões mútuas dos grupos envolvidos e destruição de estátuas de diversas figuras históricas.
Eu acho compreensível quando a população destrói bustos de ditadores sanguinários como Stalin e etc. E compreendo e apoio a retirada de determinadas estátuas de comerciantes de escravizados, mas a forma estúpida como as coisas são feitas e as ideologias são defendidas não me permite sair apoiando esses grupos. Nesse furor revolucionário muita injustiça é (e será) cometida. 

A História não é uma ciência exata e ultimamente, mais do que nunca, ela é estudada de maneira muito partidária, maniqueísta e repleta de hipocrisias. Temos que tomar cuidado com os juízes dos tribunais históricos dos autoproclamados justiceiros sociais, com a caça aos novos bruxos, com a cultura do cancelamento, com o politicamente correto progressista, com os fanáticos religiosos que ingressam na política. Enfim, com todos os ignorantes ressentidos e insatisfeitos de todos os lados que atrapalham as lutas importantes. 
Não condeno determinadas ideologias, mas os atos que são feitos em nome delas ou a deturpação das mesmas. É preciso cuidado ao analisar a dor alheia. Concordo. Assim como é preciso analisar o que pode ser feito de maneira errada na busca por uma reparação.

Na internet o compartilhamento de mensagens de apoio à destruição é feito com entusiasmo e uma total cegueira, estupidez e incapacidade de analisar os fatos e atos de maneira racional. É tudo emocional demais, passional demais. E até onde não seria falso demais? Por qual democracia e liberdade de expressão essas pessoas lutam defendendo destruição de imagens e ideias que destoam de suas convicções?

Li vários comentários dizendo que a estátua do bandeirante Borba Gato em São Paulo deveria ser destruída, uma outra já aproveitou e voltando sua mira para a literatura defendeu a queima dos livros de Monteiro Lobato.
No entanto, li muitas opiniões condenando essas depredações e propondo que essas estátuas fossem colocadas em um museu com informativos contextualizando a época e os motivos de suas criações. Realmente não se estuda História destruindo os registros da mesma.

E citando o exemplo das revoltas causadas pela permanência de estátuas de bandeirantes em São Paulo, sempre vai ter um grupo pra se ofender ou se sentir ofendido por alguma coisa. Primeiro, o bandeirante, depois o imperador, logo a estátua do músico erudito, logo o livro do escritor x, depois o filme do diretor y. É aqui onde mora o perigo: Quando determinados grupos radicalizam suas convicções e querem impor suas verdades para toda a sociedade.
(E o que tenho observado por aí é racismo sendo combatido com racismo, autoritarismo com autoritarismo, machismo com femismo, fobias com fobias, etc Mas isso é outra história).

Reitero que entendo o furor pela derrubada causada pela revolta inicial ou retirada de certas estátuas ou homenagens à figuras históricas questionáveis. Mas não é por isso que vou seguir concordando com os objetivos de qualquer grupo revoltado. Seja oprimido ou não. E vale ressaltar que uma pessoa do passado não foi apenas a alcunha ou o título pelo qual se tornou conhecida nos livros de História.

Parece que uma das últimas vítimas do "justiçamento histórico iconoclasta" foi uma estátua de Cristovão Colombo, também nos Estados Unidos. Os novos inquisidores estão conseguindo que filmes, livros, séries e desenhos animados sejam revistos sob a luz de sua visão "correta" de mundo e sejam retirados de plataformas de streaming. Como por exemplo, o clássico "E o vento levou", que foi acusado de conter mensagens racistas. Puro julgamento tardio, superficial e anacrônico.


Talvez a solução para os militantes de esquerda politicamente corretos seja a criação de um órgão governamental que analise as obras de arte, música e filmes antes de estes serem divulgados para o público. Tipo a Divisão de Censura de Diversões Públicas (DCDP), orgão governamental da época dos governos militares brasileiros.
Ou do período da Ditadura, como preferir. Ironias à parte, um dos problemas no estudo da História é quando toda a complexidade e contradições dos acontecimentos são analisados apenas por um viés marxista, de luta de classes, opressores versus oprimidos.
Por esse enfoque, apagam-se os personagens históricos em toda sua tridimensionalidade, em todas as suas nuances e pontos de vista. E sobressaem somente as limitadas análises que simplificam a História em uma enfadonha luta do "bem contra o mal". Onde mesmo os personagens vistos como o bem, os injustiçados, uma grande parcela dos sujeitos históricos são vistos como uma massa oprimida, coitados que precisam ser salvos.
Portanto, esse frenesi revolucionário por destruição de monumentos, tentativa de censura de produtos culturais etc, em muitos casos me parece mais daqueles casos em que o oprimido (o de verdade e o de mentirinha) se torna opressor. (E muitos talvez não tenham consciência disso). E sei que essa afirmação causa náuseas em muitos que leem.
Geralmente esses grupos, movimentos sociais começam com boas causas, mas em pouco tempo os objetivos e pautas são desvirtuados. Porque todo indivíduo ao fazer parte de um grupo perde gradativamente sua identidade e sua capacidade de pensar em função dos dogmas dos grupos e ao seguir as (geralmente) idiotas lideranças destes grupos.


Obs 1. A imagem colocada nessa postagem foi retirada da publicação original feita pelo instagram do canal de youtube Q4tro Coisas de Pablo Peixoto. Recomendo que conheçam. Um dos melhores youtubers do Brasil.

Obs 2. "O clássico ‘...E O Vento Levou’ (1939) vai retornar à plataforma da qual foi tirado do ar com a inclusão de uma introdução sobre racismo protagonizada pela acadêmica, pesquisadora e apresentadora de TV norte-americana Jacqueline Stewart. A informação foi noticiada pela própria pesquisadora em depoimento ao site do canal de TV norte-americano CNN. “Vou gravar uma introdução apresentando os múltiplos contextos histórias do filme. Para mim será uma oportunidade de pensar o que esse clássico pode nos ensinar" revelou a pesquisadora. 
fonte: https://revistamonet.globo.com/Filmes/noticia/2020/06/e-o-vento-levou-voltara-plataforma-de-streaming-com-introducao-sobre-racismo.html